O grande passeio
Uma velhinha pobre andava pelas
ruas. Era apelidada de Mocinha. Havia sido casada, tivera dois filhos: todos
morreram e ela ficou sozinha.
Depois de dormir em vários
lugares, Mocinha acabou não se sabia por que, passando a dormir sempre nos
fundos de uma casa grande no bairro Botafogo. Cedo ela saía passeando. Na maior
parte do tempo, a família que lá morava esquecia ela.
Certo dia, a família achou que
Mocinha já estava lá por muito tempo. Resolveram levá-la para Petrópolis,
entregá-la na casa de uma parente alemã. Um filho da casa, com a namorada e as
duas irmãs, foi passar um fim-de-semana lá e levou Mocinha.
Na noite anterior, a velhinha não
dormiu, ansiosa por causa do passeio e da mudança de vida. Como se fossem
flashes descontínuos vinha a ela na cabeça pedaços de recordações de sua vida
no Maranhão: a morte do filho Rafael atropelado por um bonde; a morte da filha
Maria Rosa, de parto; o marido, contínuo de uma repartição, sempre em manga de
camisa, ela não conseguia se lembrar do paletó... Só conseguiu dormir de tarde.
Acordaram-na cedo e a colocaram no carro.
A viagem ocorreu para Mocinha
entre cochilos e novos flashes de memória com cenas cortadas da vida passada.
Foi deixada perto da casa do irmão do rapaz que dirigia, Arnaldo; indicaram-lhe
o caminho e recomendaram que dissesse que não podia mais ficar na outra casa,
que Arnaldo a recebesse, que ela poderia até tomar conta do filho.
A alemã que era mulher de Arnaldo
estava dando comida ao filho; deixou Mocinha sentada sem lhe oferecer alimento,
aguardando o marido. Este veio, confabulou com a mulher e disse a Mocinha que
não poderia ficar com ela. Deu-lhe um pouco de dinheiro para que pegasse um
trem e voltasse para a casa de Botafogo. Ela agradeceu e saiu pela rua. Parou
para tomar um pouco de água num chafariz e continuou andando, sentindo um peso
no estômago e alguns reflexos pelo corpo, como se fossem luzes. A estrada subia
muito. “A estrada branca de sol se estendia sobre um abismo verde. Então, como
estava cansada, a velha encostou a cabeça no tronco de árvore e morreu.”
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